Médica, casada, mãe de dois gêmeos de 8 anos, a mineira Maria Fernanda * procurou o “Casar, descasar, recasar” para contar a história de separação dos seus pais, que tanto a impactou na infância e que ainda hoje tem profunda influência na sua vida.
Num almoço em um shopping em São Paulo, a bela jovem mãe, de 42 anos, me deu o depoimento que segue abaixo. Por que esse empenho todo em expor sua história? Para evitar que ela se repita em outras casas, diz Maria Fernanda, que provoca aqui uma reflexão sobre como romper um casamento por causa de um grande amor, investir nessa nova relação e, ao mesmo tempo, preservar a saúde mental dos filhos.
“Na entrada da adolescência, quando eu estava com uns 12 anos, que não é uma fase muito fácil, descobri que minha mãe tinha arrumado um namorado, um amante – a palavra é pesada e parece antiga, mas para os filhos e o ex-marido é isso que é.
Descobri por causa de telefonemas estranhos e pelo diário que ficava no quarto da minha mãe e um dia ela deixou aberto na cozinha. Comecei a ler e vi que escrevia sobre um outro homem, um namorado. Aí, veio a dúvida horrível: será que meu pai sabia? E meus irmãos? Foi supercomplicado, porque fiquei com aquele segredo. Não tinha coragem de comentar o caso nem com a minha melhor amiga. Sentia que ia expor minha mãe, meu pai, minha família toda. Não falei nada para ela, porque nunca foi meu estilo confrontar e também sabia que tinha feito uma coisa errada, invadindo a privacidade dela.
Era algo que eu ficava remoendo. Lembro que quando voltei de um acampamento de férias, minha mãe foi me buscar e disse ‘olha, fulano deu uns móveis aí para nós, mas não comenta nada com seu pai’. Ela pedia segredo, não sabendo que eu já sabia. Aquilo machucava muito.
Acabei contando para um dos meus irmãos, e para ele foi pior ainda. Até hoje é o mais complicado deles.
No fim, o casamento acabou. Meu pai saiu de casa. Para completar, após a dolorosa separação (para meu pai, eu e meus irmãos, mas não aparentemente para minha mãe, que estava apaixonada), ela se viu no direito de levar o então “namorado” para dentro de casa, como se nossa casa fosse um motel.
Ela não disse algo como ‘olha, agora eu me separei do seu pai, esse é meu namorado e vamos conviver…’. O cara aparentemente não tinha intenção de ter um relacionamento mais sério com ela nem de ser padrasto de ninguém. Ao mesmo tempo, ele estava dentro da minha casa. Vinha e dormia uma ou duas vezes por semana.
Minha mãe achava que estava no seu direito. Cheguei a ouvir que a casa era dela, que fazia o que queria e não é porque teve filhos que não poderia mais ser feliz.
Realmente, ela bancava tudo e era pesado para ela, porque meu pai se desestruturou completamente, não pagava pensão, mas ela não teve a preocupação de nos preservar.
Nunca conversamos sobre o assunto. Nossa relação é muito difícil até hoje, permeada de muita agressividade. Às vezes, ela até tenta, enfim, ajudar, proteger, até financeiramente quando eu preciso, mas não é uma pessoa muito disponível emocionalmente. Nunca foi.
Resolvi contar tudo isso aqui pensando nos pais. Tudo bem você se apaixonar, viver uma história muito intensa com uma pessoa, mas seu amor pelos filhos tem que estar preservado. Diga: ‘Eu gosto dessa pessoa desse jeito e realmente gosto muito e vou querer ficar com ela, vou investir nessa relação, mas vocês continuam importantes para mim e isso não vai mudar’. O filho tem que ter sempre certeza de que é amado, que, por mais caótica que seja a vida dos pais, ele é prioritário.
E se vai esconder, esconda, mesmo! O problema é você deixar uma porta aberta. Se vai ter um diário, deixe em um lugar trancado. Preserve a sua vida de adulto.
Quer encontrar com o namorado, transar com seu namorado (ou sua namorada)? Vá ao motel. Seja com o cônjuge, se a pessoa é casada, ou a (o) namorada (namorado), filho não tem que participar da vida sexual dos pais.
Isso me marcou para o resto da vida. Já fiz analise várias vezes, e esse sempre é um tema importante. Mas também serviu para mim como mãe. Tenho jornadas muito extensas de trabalho, só vejo meus filhos à noite. Mas procuro sempre mostrar que eu estou atenta, que me importo com o que eles sentem, com que pensam. Quero que sintam sempre que estou lá, à disposição.”
Essa mãe agiu com total descaso em relação aos seus filhos, foi vítima de muita ignorância ou padeceu de uma imensa dificuldade em fazer diferente? Não dá para julgar.
Agradeço a colaboração dessa leitora porque histórias da vida real provam que, definitivamente, não tem jeito: os pais têm que segurar a onda da crise no casamento e, ao mesmo tempo, proteger os filhos.
* Nome fictício, a pedido da leitora.