“A minha história é muito pior!”

Por Bell Kranz

Quando a pessoa está devastada pelo fim da relação, magoada, desiludida por ver os sonhos de vida em comum não realizados, enfim, sofrendo intensamente, é comum achar que a sua história de separação é a pior que existe.

O problema é que essa crença funciona feito tiro no pé. Assumir o papel de vítima só dificulta ainda mais o que por si só já não moleza, como a aceitação da perda. Vitimar-se não impulsiona ninguém a seguir em frente, a se entregar a uma nova existência, a outras rotinas. Ao contrário, o sentimento de autocomiseração imobiliza, mina a capacidade da pessoa para resolver suas questões tanto de ordem afetiva como prática. Às vezes, o drama vai parar no tribunal, e a solução de um problema tão íntimo, uma história tão pessoal é terceirizada para o Estado.

Nesse sentido, entre vários outros sentidos, o livro recém-lançado pela respeitada juíza e escritora Andréa Pachá, “Segredo de Justiça”, é exemplar. O prefácio começa com a seguinte frase: “Vou lhe contar uma coisa: somos todos iguais. Na alegria e na tristeza”. Alguns parágrafos depois, ela afirma: “Embora a experiência da dor seja individual, a nossa humanidade nos faz pouco originais nas contradições, nos afetos e nos desamores”.

 

segredo de justiça
Detalhe da capa do recente livro da juíza Andréa Pachá (Foto: divulgação)

O livro traz 48 histórias criadas pela juíza, mas cujos conflitos existiram de verdade e ela presenciou entre as mais de 18 mil audiências realizadas durante seus 15 anos como juíza da Vara de Família no Rio de Janeiro. Hoje, ela atua como juíza da 4ª Vara de Órfãos e Sucessões do Rio de Janeiro e ouvidora-geral do Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro.

Nem só aos magistrados, nem só aos separados. As histórias têm muito para encantar todo leitor, porque revelam dramas humanos das mais diferentes matizes, refletindo os sentimentos e as razões dos personagens envolvidos, como a mulher ferida mesmo depois de 17 anos separada, pois o marido a deixara para ficar com a irmã dela mais nova, ou do preocupado filho que pede na Justiça a interdição do pai, de 86 anos, que apresenta sintomas de demência senil.

A talentosa escritora e respeitada juíza Andréa Pachá (Foto: divulgação)
A talentosa escritora e respeitada juíza Andréa Pachá (Foto: divulgação)

As histórias, curiosas e emocionantes, são contados por meio de textos saborosos, leves, de humor esperto, sutil. Além disso, trazem questionamentos e reflexões a partir de uma abordagem delicada, extremamente amorosa, um olhar humano e afetuoso para o drama do outro.

“Segredo de Justiça” (224 páginas, ed. Agir), lançado no fim do ano passado, é uma espécie de complemento do best-seller “A Vida Não é Justa” (192 páginas, ed. Agir), de 2012.

Capa do best-seller de Andréa Pachá, lançado em 2013 (Foto: divulgação)
Capa do best-seller de Andréa Pachá, de 2012 (Foto: divulgação)

Neste primeiro livro, Andréa também faz ficção a partir de casos reais, porém foca nos casos dramáticos de fim do amor – uma senhorinha viciada em sexo virtual; pais que vão ao tribunal decidir a escola do filho; um garoto lutando sozinho pelo seu registro de nascimento. Logo mais, essas histórias devem estar em uma minissérie da Globo, que comprou os direitos da obra.

“Segredo de Justiça” trata da vida depois que o casamento termina, como filhos, pensão, patrimônio e velhice. Uma leitura que enriquece o repertório de homens e mulheres sobre a complexidade e as contradições dos amores e desamores.

Leia mais: “A Balada de Adam Henry”, livro do escritor best-seller Ian McEwan, em que a personagem principal é uma eminente juíza da Alta Corte britânica