Quem vai parar na Justiça para resolver enrosco familiar se depara com um glossário de termos de arrepiar! Afinal, além de leiga, a pessoa não está exatamente no momento mais leve da vida!
Se você, por exemplo, é uma mulher com filhos de casamentos diferentes, não se ofenda, mas pode ser chamada de mãe bínuba – termo jurídico para quem teve filho de mais de um casamento. Mas se é um homem que vive há 30 anos em uma união estável, contente-se em ser um convivente ou companheiro. O chamado cônjuge é aquele casado no papel. Já o viúvo, alegre ou triste, leva o pomposo título de cônjuge supérstite. Sem falar no casamento putativo e outros tantos mais ou menos bizarros.
Não só para simplificar o entendimento desses conceitos, mas também, e mais importante ainda, iluminar advogados e juízes no julgamento dos intrincados casos de amor e desamor que vão parar nos tribunais, acaba de ser lançado um ousado livro jurídico. É o “Dicionário de Direito de Família e Sucessões” (Saraiva, 760 págs.), do advogado Rodrigo da Cunha Pereira, que também é presidente do respeitado IBDFAM (Instituto Brasileiro de Direito de Família).
A obra se vale de Freud, Kant, Derrida, Lacan e ainda Adelia Prado, Virginia Woolf, Shakespeare, Drummond, Luis de Camões, Oscar Wilde, Guimarães Rosa, Ary Barroso, Chico Buarque, Cartola… e mais um tanto de nomes da pesada para ajudar a explicar os duros conceitos jurídicos.
Além do significado jurídico, trechos de música, poesia, literatura, ilustrações e fotos complementam lindamente a tradução dos verbetes. Por exemplo: para família mosaico (casal com filhos de uniões anteriores), Caetano Veloso é evocado com a letra de “Boas Vindas”:
Sua mãe e eu / Seu irmão e eu / E a mãe do seu irmão / Minha mãe e eu / Meus irmãos e eu / E os pais da sua mãe….
Cartola entra com “Tive, sim” para ilustrar o termo família recomposta, o mesmo que recasamento:
Tive sim, / outro grande amor antes do teu / Tive, sim / O que ela sonhava eram os meus sonhos e assim / Íamos vivendo em paz…
O discurso da psicanálise perpassa todo o livro. Afinal, como entender aquele casal que passa a vida brigando na Justiça? Ou a mãe que deu ao pai a guarda do filho único, mas nunca deu nem afeto nem um tostão para ajudar na sua sobrevivência? Há muito mais por trás desses conflitos, diz o autor, referindo-se às razões do inconsciente, à subjetividade, que determinam os fatos.
Sensibilizar juízes e advogados para essas sutilezas por trás dos conflitos humaniza as decisões e deve ajudar homens e mulheres enroscados em disputas e pendências amorosas na Justiça.