Novo tipo de guarda: os pais saem de casa, e as crianças ficam

Por Bell Kranz
E se em vez dos filhos fossem os pais que alternassem as casas? Foto: Jan von Holleben
Aninhamento: os pais separados vão morar, em dias alternados, na casa dos filhos (Foto: Jan von Holleben)

Por Giovanna Maradei

Pais divorciados são quase sempre sinônimo de filhos andarilhos. Com duas casas cheias de amor para dar, as crianças devem se especializar na arte de fazer malas, manter dois armários, aprender novos caminhos para a escola e, claro, planejar feriados. Melhor do que perder a convivência com a mãe ou com o pai, sem dúvida. Mas e se, em vez das crianças, fossem os adultos que colocassem a mochila nas costas e alternassem os endereços de casa?

Este formato existe, é adotado nos Estados Unidos e desconhecido no Brasil. Mas o acordo pode ser feito por todos os pais divorciados que compartilham a guarda dos filhos e que, claro, tenham condição financeira para bancar esse estilo de vida. O modelo demanda três lares: um para a mãe, um para o pai e outro para os filhos, o que significa meia casa a mais para cada adulto sustentar em um momento em que a renda está sendo dividida. Por outro lado, a opção permite que os filhos permaneçam na casa onde já moram, sem alterar sua rotina ou, como acontece às vezes, ficar longe dos amigos do bairro. Sobra para os pais a responsabilidade de administrar a casa e se organizar para morar com os filhos em períodos alternados.

Para a advogada especializada em direito de família e vice-presidente do IBDFAM, Berenice Dias, esse tipo de acordo deveria ser apresentado pelos juízes e advogados a todos os pais que possuem a guarda compartilhada como uma opção de convivência. “Não dá para a Justiça impor isso, até porque é uma opção um pouco elitista e que exige que o casal esteja de comum acordo, mas é uma situação que eu acho ideal. Uma solução encontrada por alguns pais e que funciona. A modalidade precisa ao menos ser revelada para dar as pessoas a chance de escolher”, afirma a advogada.

Quanto maior o leque de opções para que as famílias com pais separados convivam de forma saudável, melhor. Mas será que continuar dividindo a casa com o ex funciona, mesmo? Casar, descasar, recasar  lista aqui os principais prós e contras deste acordo.

PONTOS POSITIVOS

A casa cai, mas o entorno fica em pé

Ver os pais se divorciando é bastante difícil para os filhos. Mantê-los no ambiente conhecido (a mesma escola, perto da casa dos amigos, o mesmo curso de inglês, próximo da casa de um tio ou da avó, por exemplo) é uma forma de ajudá-los a lidar com a situação. Sem o ônus de ter seu dia a dia prejudicado pelo divórcio, pode ser mais fácil encarar a separação de forma positiva.

Ter atitude na própria casa é mais fácil

É comum que filhos de pais separados sintam vergonha e dificuldade de dizer para um pai que querem ir para a casa do outro. Já em um ambiente conhecido elas ficam mais à vontade para dizer o que sentem e expor suas opiniões.

Filhos protegidos

Atitudes que podem caracterizar alienação parental, como não levar os filhos para casa do ex (ou da ex) ou não repassar os medicamentos que a criança está tomando naquela semana, são inibidas quando os filhos tem apenas uma casa para chamar de sua. Afinal, nesse caso, os pais é que vão até eles e tudo o que eles precisam, do uniforme aos remédios, está sempre no mesmo lugar. 

Visita X convivência

Guarda compartilhada não é garantia de convivência entre filhos e pais separados. Muitas vezes, o que acontece é uma visita – dos filhos à casa do pai (ou da mãe) ou o contrário. No caso do aninhamento, ambos os pais convivem com os filhos, já que cada um dos adultos de fato mora durante um período com os seus filhos. Assim, a tradicional visita, quase sempre concentrada nos fins de semana, é substituída pela convivência.

Um é pouco, dois é bom, mas três pode ser demais

Quando o casal tem mais de um filho, coordenar as idas e vindas das crianças é mais complexo, assim como produzir um lar que abrigue todos confortavelmente. Neste sentido, a opção do aninhamento facilita demais a logística e a vida de todos. A americana Deanna Bowerman, de 15 anos, confirma. A jovem tem outros três irmãos e comemora a escolha dos pais pelo aninhamento: “Seria uma trabalheira deslocar todos nós, e assim os dois continuam por perto”, disse ela à reportagem do “The New York Times”.

PONTOS NEGATIVOS

Mais gastos

Em geral, o divórcio força uma diminuição no padrão de vida do casal. A renda é dividida, e tanto o pai quanto a mãe passam a ter que se virar com menos. Manter uma casa a mais pode ser simplesmente inviável. Uma opção é ficar na casa de familiares ou dividir um imóvel com amigos para os dias em que não está na casa dos filhos.

Discussões domésticas

Discutir os problemas dos filhos é altamente recomendável aos pais separados. Mas compartilhar a casa, ainda que em dias diferentes, não costuma estar nos planos de quem opta pelo divórcio. A casa é dos rebentos, mas os pais vão administrar e definir as regras, o que significa continuar conversando com o ex sobre compra de supermercado, conta de água, luz, telefone… Uma rotina que, definitivamente, não é para qualquer ex-casal.

Haja rebolado

Já pensou quando entram as madrastas, os padrastos, enteados, meio-irmãos e todos os novos integrantes da família que se multiplica? Nesses casos, os pais que optam pelo aninhamento têm que caprichar no rebolado para administrar a convivência.

A opinião alheia

O aninhamento é uma forma nova de convivência familiar, especialmente no Brasil. Por isso, o casal que fizer essa opção deve se preparar para enfrentar a reação alheia. Algumas pessoas vão apoiar a decisão e elogiar a iniciativa. Outras, muito provavelmente a maioria, vão torcer o nariz e dizer que essa é a receita para o desastre.

Momento mala

Ter quer que fazer mala toda hora para levar roupa de uma casa para a outra é cansativo, e os erros no quesito guarda-roupa sempre ocorrem. Um dia é o pai que esquece de levar o terno apropriado para o jantar da empresa, no outro é a mãe que esquece o casaco favorito no varal dos filhos. Para esses casos, o desabafo de Pennie Heath, postado no seu site, Divorce Mom, é alentador: “Fico cansada de viver com a mochila nas costas, mas então eu me dou conta que cada dia que eu arrumo a mala é um dia a menos que meus filhos têm que fazer o mesmo e fico orgulhosa por saber que eles são poupados dessa experiência”.