Casar, descasar, recasarCompartilhe a sua história – Casar, descasar, recasar http://casardescasarrecasar.blogfolha.uol.com.br Wed, 20 Apr 2016 18:43:12 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Desafio pouco é bobagem http://casardescasarrecasar.blogfolha.uol.com.br/2015/06/08/desafio-pouco-e-bobagem/ http://casardescasarrecasar.blogfolha.uol.com.br/2015/06/08/desafio-pouco-e-bobagem/#respond Mon, 08 Jun 2015 14:33:23 +0000 http://f.i.uol.com.br/folha/colunas/images/15005285.jpeg http://casardescasarrecasar.blogfolha.uol.com.br/?p=1712 Quem pega táxi sabe. Ou conversa com o motorista ou conversa com o motorista. Fingir-se de morta no banco de trás não funciona, essa turma do taxímetro nunca vai brincar de vaca amarela com o passageiro. O negócio deles é papear. O meu também. E tenho tido sorte desde que quebrei o pulso e, com o braço imobilizado, para me proteger dos solavancos dos ônibus, sou obrigada a andar de táxi.

A história da chefe confeiteira Rosa Gonzalez, compartilhada abaixo, me fez lembrar de um desses causos, também compartilhados, porém no carro. Eu havia acabado de presenciar, em um supermercado caro de um shopping luxuoso, a cena de um homem de seus 50 anos humilhado pela mulher, na frente da filha pequena, da babá e da geladeira de frios, por tentar escolher um queijo diferente do que ela costumava comprar. Depois, na espera do caixa, ele sussurrava “mulher chata, mulher chata, mulher chata” várias vezes enquanto ela reclamava da lentidão da fila.

Entrei no táxi e a converseira começou, como sempre, na escolha do melhor trajeto, seguida da corrupção do governo, Haddad, Dilma, ciclovias e, quando eu me dou conta, ele está contando a história terrível do vizinho e amigo tratado pela mulher feito um cachorro desde que ela descobriu uma traição dele. E por que ele suporta? “Não se separa para não perder os bens, a casa, o carro”, contou indignado o motorista. Devia ser o caso da “mulher chata” e o homem do queijo, presos pelo medo.

Mal sabem eles que nada melhor do que um desafio a mais, especialmente na área profissional, para ajudar a encarar o outro com vigor. A paulistana Rosa Gonzalez, de 39 anos, que o diga. Ela mudou de profissão e estado civil de uma só vez. Leia aqui.

Rosa Gonzales na cozinha do seu ateliê de doces
Rosa Gonzalez na cozinha do Ateliê Dona Formiga, empresa que abriu seis meses antes de se separar

Um desafio ajuda a enfrentar o outro

Depoimento de Rosa Gonzalez à Giovanna Maradei

“O casamento não acaba quando a gente se separa, o casamento já acabou. Não vou falar que o meu foi horrível, fui casada por dez anos e ninguém fica todo esse tempo em um casamento horrível.

Eu era arquiteta e não aguentava mais trabalhar com obra. Então, comecei uma fase de investimento em mim. Fui fazer vários cursos, entre eles o de confeitaria e acabei descobrindo uma nova carreira.

O Ateliê tinha só seis meses quando eu me separei, a empresa era um bebê, então tive que trabalhar muito. Não podia pensar só na separação e acabei enfiando a cara no trabalho. Se eu estivesse casada, não sei se teria construído tudo isso.

Fui eu que decidi me divorciar e descobri que quem toma a decisão sofre primeiro. Quando você começa a formatar a ideia, você coloca na balança um milhão de coisas, casamento, família, financeiro – se tem filho, então, você pensa mil vezes. Eu tive uma briga muito grande e depois dela meu casamento entrou em uma crise enorme, mas ainda demorei quatro ou cinco meses para ter coragem de me divorciar.

É um passo muito grande. Você pega todos os sonhos que fez com aquela pessoa, as viagens que planejava, a casa que os dois queriam comprar, o carro, tudo, coloca em uma caixinha e fecha, porque você nunca mais vai realizá-los. Essa foi a minha sensação no dia em que eu assinei o divórcio. Mas, dali para a frente, os sonhos eram só meus, e então eu tinha que começar a planejar a vida.

Eu estava abrindo um negócio novo, iniciando a minha vida de novo. Tinha medo, tenho até hoje, óbvio, é o meu sustento, mas quando você enfrenta família, preconceitos, filho –­ porque nada é mais difícil do que contar sobre a separação para os filhos –, você descobre uma força que nem sabia ter.

Não me arrependi em nenhum momento. Tentei o suficiente até ter certeza de que era isso o que eu tinha que fazer. Tenho amigas que falam: ‘Eu não me separo porque eu não consigo me bancar financeiramente’ ou ‘eu não me separo por causa do meu filho’, e quando escuto esse tipo de coisa penso ‘isso é covardia’.

Se você não dá conta de se sustentar com seu dinheiro, reduza seu padrão de vida, mas vai ser feliz. Talvez eu esteja sendo uma pouco radical, mas acho que a gente está no mundo para ser feliz. Se você não está feliz, tem que fazer alguma coisa para mudar. Ou você faz o casamento funcionar, ou sai dele, não tem outra opção. Para mim, ficou muito claro que eu tinha que mudar. Do mesmo jeito que eu fiz em relação a trabalho.

Acho que o ser humano é feito de um monte de caixinhas. Você tem a caixinha do pai e da mãe, dos amigos, de uma série de coisas. No processo do divórcio, a gente mexe em várias dessas caixinhas – a família sai da caixa para vir para cima de você, os amigos também e de repente você tem que lidar com uma dinâmica absurda. Neste momento, dedicar-se ao meu trabalho foi o jeito que eu encontrei de fugir de todo o mundo, de sair de cena. Uma válvula de escape.

Quando você foca em outra coisa, em algo novo, tem tempo de se dedicar e ver seu trabalho crescer e se desenvolver. Quando a gente está lidando com perdas, como é a separação, ter alguns ganhos é muito interessante. A autoestima também aumenta. Você fala ‘eu sou capaz, eu sobrevivo sozinha, eu me viro’.

Não dá para abandonar a vida pessoal, principalmente se você tiver filhos. Mas enfiar a cara no trabalho resolve dois problemas: o financeiro e o foco. Tudo aquilo em que você põe energia cresce, e o trabalho me levou a dedicar minha energia para algo que me trouxe crescimento, e não ficar apenas alimentando o sofrimento.

O meu pai me chamou de louca, disse que, justamente quando eu estava me separando, eu rasguei o diploma de arquitetura para pilotar um fogão. ‘Olha tudo o que você está mexendo na sua vida ao mesmo tempo!’, ele me disse uma vez. Coisa de pai que estava preocupado. Hoje, ele me apoia muito e fica cheio de orgulho do que eu construí.”

 

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Mantenha a calma e tenha um vibrador http://casardescasarrecasar.blogfolha.uol.com.br/2015/05/15/mantenha-a-calma-e-tenha-um-vibrador/ http://casardescasarrecasar.blogfolha.uol.com.br/2015/05/15/mantenha-a-calma-e-tenha-um-vibrador/#respond Fri, 15 May 2015 13:49:18 +0000 http://f.i.uol.com.br/folha/colunas/images/15005285.jpeg http://casardescasarrecasar.blogfolha.uol.com.br/?p=1644 finde me a vibrator

O vibrador foi inventado por um médico no século 19 para substituir o trabalho manual dos colegas que sofriam uma espécie de LER (lesão por esforço repetitivo) de tanto masturbar suas pacientes. Parece piada, mas essa é a história da origem do acessório, instrumento médico para tratar uma doença psíquica conhecida como histeria, cujos sintomas eram irritabilidade, ansiedade, choro, falta ou excesso de apetite, entre outros altos e baixos. Para tanto, o clitóris era massageado até a paciente atingir o “paroxismo histérico”, ou o hoje conhecido orgasmo, como conta o jornalista britânico Jonathan Margolis em “A História Íntima do Orgasmo” (editora Ediouro).

A invenção do aparelho sexual também é mote de um filme de ficção histórica e comédia inteligente, irônica, perspicaz, que retrata a época bizarra em que a mulher não tinha direito de votar, era excluída do mundo acadêmico e o funcionamento do seu corpo, um completo desconhecido. Trata-se da produção inglesa “Histeria”, de 2011 – assista o trailer aqui.

Hoje, o vibrador é guardado com cuidado na mesa de cabeceira de mulheres saudáveis. Seu uso é indicado por ginecologistas e sexólogos para ajudar no prazer feminino e do casal. Não substitui carinho, beijos, sussurros ou olhares apaixonados. Mas apimenta a relação sexual e desperta libidos adormecidas.

A americana Jennifer Cullen, editora do site middleSexy.co, experimentou o acessório depois que se divorciou, quando entrava nos 40, e nunca mais se separou dele. Casou de novo e levou o vibrador junto. Leia o depoimento dela abaixo.

Meu primeiro vibrador

Por Jennifer Cullen

Depois que eu me divorciei, uma grande amiga me deu um vibrador e disse para eu ir para casa e usá-lo.

Eu estava com quase 40 anos de idade e nunca tinha visto um vibrador de perto.

O que eu ganhei era um daqueles que imita um batom. Pequeno, mas poderoso!

Na primeira vez, foi estranho usá-lo. Eu ainda lembro a minha hesitação. Até esperei meus filhos irem passar a noite na casa do pai. Chequei se todas as portas estavam trancadas e subi as escadas para o meu quarto.

Uau! Como foi bom. Eu não conseguia lembrar a última vez que havia tido um orgasmo. No ano que antecedeu o meu divórcio, ou até antes, minha sexualidade hibernou. Muito estresse e angústia causados pela lenta desintegração do meu casamento.

Precisei de muito tempo para eu me sentir realmente confortável comigo mesmo. Mas  despertar minha sexualidade lentamente, com a ajuda de um vibrador, foi justamente o que eu precisava. Eu não tive que me preocupar com sexo seguro ou em me sentir desconfortável por estar com alguém novo, depois de viver com meu ex nos últimos dez anos.

Desde então eu recasei e aumentei a minha coleção de vibradores. Não que eu não aproveite a minha sexualidade com meu marido, porque eu aproveito. Uso brinquedos tanto com ele quanto sozinha. Como a maioria dos casais da nossa idade, vivemos vidas cheias de trabalho, crianças e outros compromissos. Muitas noites vamos dormir em horários diferentes. Aproveitar minha sexualidade sem ele, só melhora os momentos íntimos que temos juntos.

Quanto mais você faz, maior fica a sua libido.

Você não precisa se divorciar para redescobrir sua sexualidade. Você só precisa manter uma mente aberta e estar disposta a entrar em contato com uma parte de você que talvez esteja tirando uma longa soneca. Afinal, ela está lá e agora é o momento de acordá-la.

Se você está preocupada em encontrar uma das professoras dos seus filhos no sex shop, compre online e pronto, o anonimato é garantido.

Jennifer Cullen (@dewlaps) é editora do Middle Sexy e colabora com o blog Life’s Dewlaps

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Que nem coelho, mas sem filhos http://casardescasarrecasar.blogfolha.uol.com.br/2015/04/28/que-nem-coelho-mas-sem-filhos/ http://casardescasarrecasar.blogfolha.uol.com.br/2015/04/28/que-nem-coelho-mas-sem-filhos/#respond Tue, 28 Apr 2015 16:33:11 +0000 http://f.i.uol.com.br/folha/colunas/images/15005285.jpeg http://casardescasarrecasar.blogfolha.uol.com.br/?p=1496 kissing-rabbits
Amar, casar e fazer sexo feito coelho, mas sem gerar filhos é uma escolha do casal que ainda incomoda os outros

Mulher, casada e que não gosta de criança. Confesso, bem sem graça, que já tive opinião preconceituosa em relação a esse perfil feminino. Lembro especialmente de uma cena que presenciei no século passado, quando meus filhos eram pequenos e fui, sem eles, jantar na casa de um casal conhecido.

Enquanto o papo rolava solto no momento drinques, um buldogue pesadão se arrastava pela sala, roçando vez ou outra a perna das visitas ­– e poderia ter sido um elegante whippet ou um peludo fofinho que não faria diferença.

Quando o tema filhos surgiu na roda (o que invariavelmente acontece), a anfitriã declarou, em alto e bom som, preferir de longe cachorros a crianças. Fiquei em choque – eu era tolinha!

Hoje somos amigas, ela não teve filho (por sorte do possível rebento), adquiriu um filhote recentemente e, passados três meses, doou o bicho, porque também já não aguenta a função.

Neste século marcado pela pluralidade, pelo debate sobre tolerância, cooperação e respeito à diversidade, mulher que escolhe não ter filhos ainda sofre, por incrível que pareça, preconceito e uma pressão social muito forte.

Nos Estados Unidos, existe até grupo de apoio para as chamadas NoMos (abreviação de Not Mothers ou não mães, em inglês), mulheres que não investiram na maternidade seja porque não quiseram, não encontraram um parceiro ideal, por infertilidade ou outra razão. Entre as celebs da geração NoMos, a atriz Cameron Dias é a porta-voz do direito de optar em não ter filhos e ser feliz.

É sobre essa experiência o tema do guest post de hoje, assinado pela blogueira feminista e professora do Departamento de Letras Estrangeiras da Universidade Federal do Ceará Lola Aronovich. Ela relata aqui com humor as cobranças que sofreu, junto com o marido, por causa da sua “ambição de transar que nem coelhinhos, mas sem esses efeitos colaterais chamados filhos”.

A opção por não ter filhos

Por Lola Aronovich

Eu tinha 23 anos quando conheci o – vamos ser piegas – amor da minha vida. Ele, 32. Nenhum dos dois havia namorado sério antes. Tínhamos apenas uma certeza: se ficássemos juntos, não teríamos filhos.

Por que essa certeza? Até hoje não sei. Claro, havia um pouco de “não gosto de crianças”, argumento usado mais como defesa que como justificativa verdadeira (e hoje já assumi: adoro crianças, mais ainda quando não tenho que ficar com elas o tempo todo). Talvez houvesse um espírito rebelde, que também contaminara meus irmãos (aos 40 anos, nem eu, nem meus dois irmãos tinham filhos, para desespero da minha mãe, que queria muito ser avó). Ou quem sabe não era tão profundo. Era apenas a suspeita de que a vida estava boa daquele jeito. Por que complicá-la?

Portanto, pouco depois de nos conhecermos, procuramos um médico. Expusemos a situação: estávamos apaixonados, tínhamos a ambição de transar que nem coelhinhos, mas sem esses efeitos colaterais chamados filhos. O maridão, então namoradão, poderia fazer uma vasectomia? O médico foi categórico: jamais. Se ao menos ele tivesse filhos, podíamos pensar no assunto. Mas ele era jovem demais para se submeter a um procedimento irreversível. Nenhum médico aceitaria fazer a cirurgia, garantiu. E ainda emendou: “Não é porque você não toca piano que vai querer cortar os dedos”.

Saímos do consultório arrastando os pés: nenhum de nós sonhava em ser Chopin.

Mas o médico estava convicto de que cedo ou tarde nos renderíamos à normalidade e faríamos o que tantos casais fazem – um filho.

Não fizemos. Não por falta de pressão. As cobranças eram frequentes, quase sempre para o meu lado. Eu era a tirana que estaria impedindo meu marido de satisfazer o sonho de todo homem, ser pai. Era impensável que ele não quisesse. E lógico que eu queria! Tinha que querer. Onde está seu instinto maternal, menina? E sem dúvida que um casal sem filhos não iria ficar junto por muito tempo! Até hoje, um monte de gente crê que sou infértil, seca, incapaz de reprodução. Não querer parece não ser uma opção.

Ah, se eles soubessem! Se soubessem que o mundo mudou. Na década de 1970, uma em cada dez mulheres nos EUA chegava à menopausa sem ter tido filhos. Hoje, esse número é de uma em cada cinco. Continuo sendo exceção, mas 20% não é tão desprezível. No Brasil, 4% dos domicílios é formado por DINCs (sigla para double income, no children, ou dupla renda, sem filhos). E se os estacionados no tempo soubessem que filhos não necessariamente trazem felicidade! Um estudo realizado com 909 donas de casa no Texas pediu para que elencassem suas atividades favoritas. “Cuidar dos filhos” ficou em 16º lugar, num total de 19 atividades. Até limpar a casa acabou na frente!

No entanto, ainda há muita gente que acha que você é um ser humano incompleto se não deixou a alguém o legado da sua miséria. Lembro-me bem de um blogueiro americano, pai de três, que há alguns anos vaticinou: quem não se reproduz é como uma vela ao vento, que se apagará ao morrer sem deixar marca alguma.

Seus leitores se indignaram: mas e os pais adotivos? E os homossexuais? E os héteros que adorariam, mas não conseguem ter filhos? E a Madre Teresa de Calcutá? Não seria muito narcisismo pensar que só espalhando sua sementinha você está sendo útil à humanidade? O blogueiro acabou pedindo desculpas.

Quanto ao maridão e eu, quase um quarto de século depois de nos conhecermos, continuamos juntos, apaixonados, sem filhos e sem o menor arrependimento de não tê-los. Em compensação, nossa ideia original de imitar a intensa vida sexual dos coelhos foi para as cucuias.

Lola Aronovich, 47, é professora do Departamento de Letras Estrangeiras da Universidade Federal do Ceará e autora do blog Escreva Lola Escreva 

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“Dicas” de superação quase afundaram leitora http://casardescasarrecasar.blogfolha.uol.com.br/2015/03/10/dicas-de-superacao-quase-afundaram-leitora/ http://casardescasarrecasar.blogfolha.uol.com.br/2015/03/10/dicas-de-superacao-quase-afundaram-leitora/#respond Tue, 10 Mar 2015 14:42:07 +0000 http://f.i.uol.com.br/folha/colunas/images/15005285.jpeg http://casardescasarrecasar.blogfolha.uol.com.br/?p=1161 Tudo passa pela educação, não tem jeito – até protesto com panela, como se viu no último domingo, pode ser elegante, com dignidade, ou do tipo desqualificável, selvagem. Mas como nem tudo a gente aprende, então improvisa, cheio de boas intenções. Já o resultado, às vezes, é desastroso. Diante de alguém que se separou, por exemplo, fala-se cada batatada.

É o que compartilha aqui uma jovem leitora valente e bem-humorada. Sua história inclui duas experiências de tirar qualquer um do eixo: um câncer de mama e, mais tarde, a separação do marido. Mas o ponto central da sua mensagem é outro, ou melhor, são os outros. A atitude de quem quer ajudar e, no caso dela, provocou sentimentos semelhantes tanto no enfrentamento da doença como do fim do casamento.

O desabafo também faz um alerta contra a parafernália de fórmulas de superação espalhadas a rodo na net e algumas publicações. Um Google rápido com as palavras superação e separação traz “dicas” que mais parecem piada de muito mau gosto. Um exemplo: “Questione as qualidades do ex e encontre defeitos; aos poucos, os pensamentos ruins sobre ele ou ela vão ajudar a minar os sentimentos amorosos”.

As fases do luto são bem conhecidas e iguais para quase todo mundo. Agora, de que maneira percorrer esse caminho é uma questão individual, uma escolha de cada um. Não é bolo, que tem a receita certa. O crescimento pessoal, sim, espera-se seja um ganho final para todos.

"Foi sozinha que eu percebi que não deveria me culpar porque o problema não era comigo" (Foto: Derek Fernandes)
“Foi sozinha que eu percebi que não deveria me culpar porque o problema não era comigo” (Foto: Derek Fernandes)

“Precisei de um câncer e uma separação para perceber o que importa mesmo”

Por Ana Michelle

“Vim compartilhar minha história.

No dia 27 de dezembro de 2014, meu então marido saiu de casa. Depois de cinco dias de profundo sofrimento e cinco quilos a menos, cansei de ouvir conselhos, de chorar e bolar vinganças malignas e apenas decidi: vou tomar um porre, fazer uma tatuagem e transar com um cara bem gato just for fun, depois eu penso o que faço da vida.

Nesse período, tenho lido muito sobre o assunto “separação” e a minha sensação é de que a maioria das pessoas que lista aqueles 10 passos para dar a volta por cima nunca passaram por um rompimento com alguém que realmente amavam. Não é possível! Quer dizer então que além de levar um pé na bunda ainda tenho que acordar no dia seguinte linda, me amando muito, planejando o encontro futuro com “o cara certo” e sair com suas várias amigas para badalar e dar muita risada porque a vida é bela e você PRECISA deixar o passado com alguém que “não te merece” para trás.

Parece que ficar bem vira uma obrigação e você tem que dar a volta por cima rapidinho senão já acham que você é um caso perdido de depressão. Qual é o problema de não sair? De não querer um novo romance? De querer ficar sozinha em casa fazendo nada? Como cansam as regras sobre a volta por cima!

Achei que nunca mais passaria pelos sentimentos de quem teve um câncer de mama aos 28 anos, mas tem sido bem parecido com o que tenho vivido agora, por mais absurdo que possa parecer. Na época, lembro que me irritava profundamente a cobrança de todos para que eu ficasse o tempo todo sorrindo e falando sobre o quanto tinha sorte por estar viva. Não bastava ter um peito mofado e uma cicatriz gigante, enfrentar quimioterapia, radioterapia, três cirurgias com anestesia geral e dez quilos a mais na balança destruindo a autoestima, ainda tinha que colocar uma capinha de heroína cada vez que saía de casa ou conversava com alguém.

O câncer tirou de mim o direito de ser uma pessoa normal, que reclama, xinga, fica brava. Dia desses postei sobre como queria ganhar na Megasena, e tive que aturar as tias falando que eu já ganhara por estar viva! Ai, me deixa querer ganhar na Megasena em paz, raios! 

Separar-se não tem sido muito diferente do que vivi na doença. No começo, a palavra era impronunciável: separação. Depois, já vinha a carinha de Gato de Botas da sociedade, dizendo “mas como, vocês eram perfeitos juntos”. Aí já emenda com “você vai arrumar uma pessoa muito melhor”. Ou “foi um livramento, ele não te merecia”. Assim como no câncer, sabe o que ninguém me perguntou até esse momento? “Como EU estou lidando”,  “o que EU quero fazer”.

Sim, eu segui os conselhos e saí com as amigas. Na primeira vez, eu desmaiei nos braços de um argentino (porque estava sem comer, bebi e estava nervosa rs), ainda bem que ele era gato! Na segunda, eu voltei para casa chorando porque simplesmente não conseguia me ver naquele cenário de guerra e pegação. Daí, resolvi ficar quieta em casa, tentando me satisfazer com a minha própria companhia. Recebi algumas mensagens de pessoas preocupadas com depressão, e isso me fez rir. Estaria, sim, em depressão se estivesse seguindo os conselhos mirabolantes de dar uma volta relâmpago por cima e postar sobre como estou feliz e me sentindo linda agora que estou ‘livre’.

Ficar só, chorar, sofrer, pensar e chorar mais um pouco me trouxe uma força que não tive nem na pior das quimioterapias. Saí de um casamento que muitos consideravam perfeito porque o marido tinha um sério problema com a monogamia. Não, ele nunca me traiu fisicamente (eu continuo apostando nisso), mas sempre havia uma Fernanda, uma Juliana, uma Marina, uma Carla, uma Helena no celular, no Facebook, no WhatsApp e no cafezinho do trabalho que pareciam ter muito mais valor e sabor do que a mulher fiel e dedicada que ele tinha em casa. E foi sozinha que eu percebi que não deveria me culpar porque o problema não era comigo. Foi sozinha que descobri que na verdade ele é um imaturo com sérios problemas de autoestima. Foi sozinha que um dia acordei e senti “ei, na verdade, eu sou muito para ele”. E foi assim que dei a volta por cima, SOZINHA e por MIM.

Não vou ficar dando conselho para ninguém, mas, se me permite uma dica, diria que a melhor forma de enfrentar uma separação é não fazendo coisas que as pessoas acham que você deve fazer. Se me perguntam hoje como estou, não me sinto na obrigação de parecer uma heroína, porque foi um peso assumir esse personagem com poderes sobrenaturais quando estava doente. Apenas digo “nem feliz, nem triste, estou vivendo os acontecimentos”. Se terei um novo amor, ou se vou mudar de país, ou vou voltar com o ex, eu não sei. Descobri um universo repleto de possibilidades. O que eu te digo é que precisei de um câncer e uma separação para perceber que o que importa mesmo é você ser honesto com você, sem joguinhos, sem conselhos que fazem você se sentir pior ainda ou te obrigam a parecer forte quando no fundo tudo o que você quer é sua vida de volta (por pior que ela tenha sido).

Seja você, esqueça as regras! Sofra, grite, chore e, se for para se sentir melhor, liga para o infeliz xingando, porque pode ser libertador. Ah, e antes que você me pergunte, já tomei o porre e já fiz a tatuagem ;).”

Ana Michelle, 32 anos, é jornalista e mantém o blog Papo de Casa http://www.papodecasa.com/

 

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Casamento em Las Vegas e amor sólido http://casardescasarrecasar.blogfolha.uol.com.br/2015/03/03/casamento-em-las-vegas-e-amor-solido/ http://casardescasarrecasar.blogfolha.uol.com.br/2015/03/03/casamento-em-las-vegas-e-amor-solido/#respond Tue, 03 Mar 2015 13:30:02 +0000 http://f.i.uol.com.br/folha/colunas/images/15005285.jpeg http://casardescasarrecasar.blogfolha.uol.com.br/?p=1099 Uma ida ao cabeleireiro no sábado rendeu encontros expressos e simultâneos com duas jovens que vivem momentos amorosos distintos. Mas os dois casos fazem lembrar o famoso conceito do sociólogo polonês Zygmunt Bauman sobre a existência fluida do homem moderno, a sociedade líquida, o amor líquido e, a estes, acrescento a separação líquida.

A moça sentada de frente para o espelho, enquanto as madeixas escuras eram repicadas, com fios salpicando para todo lado, falava em alto e excitado som: “Coloca essa nota no seu blog, acabo de me casar em Las Vegas! Casamos lá para experimentar. Se der certo, validamos no Brasil. Se não der, posso casar depois aqui”. É tendência.

Ao mesmo tempo, a mais jovem ao lado, de 26 anos e com os olhos lacrimejando, conta emocionada que se separou. O noivo era seu melhor amigo, o pai dela patrocinou uma festa de princesa, mas o casamento naufragou depois de três anos. Ela estava mortificada. E a noiva de Las Vegas, que parecia não perceber a emoção alheia, atravessa a conversa para anunciar que vai estrear um blog de style!

Segundo a garota, todas as amigas da sua idade querem casar cedo e muitas já estão na etapa separação. Para explicar essa tendência, ela cita o baixo grau de tolerância geral dos casais.

Parece que o que permite casar hoje é a separação – ou o casamento realizado fora do país (sic!). O fato é que relacionamentos fluidos e separações idem alienam e fazem sofrer.

Um ex-marido escreve hoje para o “Casar, descasar recasar”. Ele advoga em nome do amor sólido, que cria memória, transforma e se mantém respeitado quando a relação acaba. Para isso, haja trabalho e algumas virtudes.

(Ilustração: Marcelo Cipis)
(Ilustração: Marcelo Cipis)

Attraversare

Por Itibere Muarrek

Os italianos têm um termo que usam para um relacionamento amoroso que acho perfeito: attraversare. Atravessar a vida, ter uma companheira para realizar a travessia da vida. Para completar a ideia, acrescento uma frase do poeta Fernando Pessoa: “Navegar é preciso, viver não é preciso”.

Não há nada mais impreciso que a própria vida e atrelar nossa felicidade com a de outra pessoa torna a vida insana. Insano porque somar duas inconstâncias que se prometem amor eterno não é nada razoável.

Mas navegar é preciso, acreditar que vale a pena é preciso, saber o quanto a vida lhe é generosa ao lhe dar um amor para viver sublimemente é preciso. É nossa absolvição do cotidiano e o único meio de conquistarmos estados de felicidade. E aí, recheio este texto com mais uma citação, bem ao gosto de autoajuda em pílulas de 140 caracteres: “Um navio no porto é seguro, mas não é para isso que os navios foram feitos”, pensamento de William Shedd [teólogo norte-americano; 1820-1894].

Queremos a segurança em um relacionamento amoroso, podemos com precisão traçar rotas e objetivos para atravessar a vida com a companheira, mas viver é impreciso. Paradoxo do nosso tempo: ficar no porto nos torna obsoletos, seguir adiante, desbravando a vida, nos torna vulneráveis.

Fato do nosso momento civilizatório, parece que nada é eterno: relacionamentos ficam obsoletos, a renovação e a inovação têm que ser constantes. Mas essa é a natureza para APPs, não para “sistemas operacionais” do tipo humanos, que exigem conhecimento acumulado, estrutura e muita dedicação para se desenvolverem e se manterem.

A vida só se faz sentida quando nossas experiências e gostos se põem à prova, se aprofundam e ficam na memória. E isso se dá com repetição, reiteração, aprofundamento, com erros calculados (ou pensados, ao menos). Essa forma de viver cria um elo inquebrável com filhos, família, amigos, mas não garante a permanência física da companheira. A companheira vem e pode desaparecer por química para alguns ou alquimia para outros.

A companheira é um “ente” que nos retira do individualismo e potencializa nós mesmos e todo nosso entorno, coloco no ápice seu valor para a vida de um homem. É a pessoa que está ao seu lado e em você, simultaneamente. Ela se faz presente em como pensamos a realidade e construímos o futuro. E aí que a porca torce o rabo: quando o relacionamento acaba, se esvazia o futuro, o presente degringola, o cinza passa a ser o tom padrão do cotidiano – você até pode conseguir viver em 50 tons de cinzas por um tempo, mas o colorido da vida não terá.

O fim de um relacionamento, de uma hora para a outra, transforma tudo à nossa volta. Reorganizar vida com filho, pagar mais contas, refazer desejos de consumo e relação com amigos, perder a convivência com a outra família, ter novos objetivos sociais, maior dosagem alcoólica e sexo for fun… Enfim, livre. Toda a liberdade do mundo para ir aonde quiser. Mas ir para onde? Ir com quem? Com que bagagem?

Todo relacionamento acrescenta experiências que nos transformam e, portanto, não acabam pela sua ausência. A memória triunfa. Paradoxalmente, aceitar essa impermanência (mesmo não desejável) é o primeiro passo para criarmos condições para uma vida leve e aberta e tentarmos (quem sabe) um relacionamento estável como se fosse o último da série.

Em minha vida, entre tantos valores que aprendi de meus pais, familiares, amigos e que procuro cultivá-los – a grande custo, sim, pois está nada fácil suportar a violência nestes tempos de cólera, consumismo, sexo como commodities ou APPs e coletivos idealistas a cerca da vida alheia –, quatro virtudes foram relevantes em minha experiência de construção e reconstrução da minha vida amorosa. São elas: generosidade, resiliência, autoconfiança e humor.

GENEROSIDADE É o trunfo maior dessas virtudes, pois nela reside saber valorizar a companheira sem juízo de valores ou preconceitos, proporciona que o relacionamento se inicie sem a máscara da perfeição, do sonho, da ilusão. Reconhecer nossas imperfeições e fraquezas é o primeiro passo para que um relacionamento possa crescer com honestidade e cioso de podermos melhorar e aceitar a parceira e a nós mesmos. E, se em algum relacionamento filhos forem gerados, é a generosidade que projeta nos filhos uma perspectiva de que valeu a pena se relacionar, podemos ver neles as virtudes do casal. Isso também se expande aos familiares da relação que acabou, que estarão à distância para o resto de nossas vidas. Mas também são nossos, remotamente, a partir de nosso filho, pelos seus 50% de sangue e memórias.

RESILIÊNCIA Se a generosidade evita que o casal destrua completamente a embarcação por brigas, ranços, desconfianças, ela não evita que a embarcação seja desmontada e dividida ao meio. Daí entra a resiliência, que é nossa capacidade de resistir à derrocada, de consertar os estragos, arrumar as velas, estancar furos na canoa, retirar a água que afundava a embarcação e encontrar um novo rumo para sua história. A resiliência permite a reconstrução de nós mesmos e do nosso meio ambiente e social. Esta condição está ligada intimamente com a generosidade, pois sem a compreensão de que erros acontecem, que somos falíveis, que a vida está sujeita a altos e baixos sendo testados por novidades o tempo todo, não seguramos o rojão que são os últimos meses de um relacionamento. Sempre rojão. A perda é dos dois, de quem ainda ama e daquele que já não sabe o que faz naquele barco.

AUTOCONFIANÇA Consegue ser generoso com o mundo que o rodeia, nem que seja apenas pelo filho ou para seu sossego? Aguenta as pancadas e quedas da vida? Então, é bom que sua autoconfiança esteja em dia. Sem ela, ficamos desnorteados e sem rumo. Qualquer novo embate e oportunidade de relacionamento se tornam uma luta inglória, se não acreditamos que podemos sempre fazer mais e melhor, reconstruir a vida e num patamar melhor. Só com autoconfiança conseguimos remontar o barco e acolher a nova companheira para continuar a travessia, atento e seguro de que, desta vez, tentará não acumular furos, evitando os icebergs pelo caminho.

Casar, separar, recasar, parece sempre difícil e trabalhoso. E é!

HUMOR É o que inicia e finaliza bem um relacionamento ou vários relacionamentos, é o que nos faz aceitar com alto astral nossas próprias imperfeições e as imprecisões de viver. É o humor que nos humaniza e nos coloca lado a lado com todos de nosso entorno. O humor combate o rancor, a angústia, traz resultados próximos de um momento sublime de felicidade, ao que nos reduz em importância e nos eleva ao som do riso.

Casar, separar, recasar, separar, recasar… Pouco importa o quanto isso se faça contínuo, quantas vezes tenhamos que remontar a embarcação, refazer rumos. O fundamental é que na travessia da vida a gente construa uma memória que funda o passado, o presente e o futuro, que honre a família, que se perpetue nos descendentes e que tenhamos na companheira escolhida a testemunha e confidente íntima dos desejos que temos e vontades que efetivamos.

Itibere Muarrek, 46, casado, descasado e, hoje, marinado, é mestre em economia pela PUC-SP e trabalha com comunicação e marketing

 

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Novos leitores contam o que aprenderam com a separação http://casardescasarrecasar.blogfolha.uol.com.br/2015/02/24/novos-leitores-contam-o-que-aprenderam-com-a-separacao/ http://casardescasarrecasar.blogfolha.uol.com.br/2015/02/24/novos-leitores-contam-o-que-aprenderam-com-a-separacao/#respond Tue, 24 Feb 2015 14:58:32 +0000 http://f.i.uol.com.br/folha/colunas/images/15005285.jpeg http://casardescasarrecasar.blogfolha.uol.com.br/?p=926 Casar, descasar, recasar” publica aqui uma nova leva de comentários enviados pelos leitores em resposta à pergunta “O que você aprendeu com a separação?”, que acompanhou o texto em que eu listo alguns dos meus aprendizados.

Afinal, o fim de uma relação nunca é fácil, não só no caso de casamentos longos seguidos de rompimentos descuidados, mas até quando não se deseja mais manter a relação. A boa notícia é que a separação pode ser transformadora. Identificar esse ganho e explorar as novas possibilidades que ele traz faz valer a pena enfrentar essa barra – sempre de forma íntegra e responsável.

Segue uma amostra dos quase 300 comentários enviados ao blog, a primeira leva pode ser lida aqui.

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“Até que a morte nos separe: coisa que existe entre pais e filhos” http://casardescasarrecasar.blogfolha.uol.com.br/2015/02/04/ate-que-a-morte-nos-separe-coisa-que-existe-entre-pais-e-filhos/ http://casardescasarrecasar.blogfolha.uol.com.br/2015/02/04/ate-que-a-morte-nos-separe-coisa-que-existe-entre-pais-e-filhos/#respond Wed, 04 Feb 2015 16:18:40 +0000 http://f.i.uol.com.br/folha/colunas/images/15005285.jpeg http://casardescasarrecasar.blogfolha.uol.com.br/?p=765 Kico Gemael, jornalista de TV dos mais competentes, é também conhecido, entre os amigos, pelo seu lado galinha – de mãe galinha! Como pai, ele é uma mãezona. Entre a saída de um casamento e o começo de outro (teve cinco até agora), Kico tem a proeza de “carregar” os filhos junto, mantendo a “ninhada” sempre perto.

A encantadora história de amor contada aqui é demonstração exemplar de que casamento acaba, casal se separa, constitui outra união, mas os filhos nunca ficam para trás – inclusive os da ex-parceira, que não são de sangue, mas de coração, como a enteada Camila.

Kiko e a enteada, Camila, no dia do casamento dela
Kiko e a enteada, Camila, no dia do casamento dela (Foto Arquivo pessoal)

Por Kico Gemael

“É a cara do pai.” Faz 25 anos que ouvi esta frase pela primeira vez. E nunca mais parei de ouvir. A primeira foi na feira, dita pelo Valdir da banca de frutas. Amigo das antigas, chamei Valdir num canto e cochichei: “Camila não é minha filha de sangue, é de coração. E tem tanto coração nessa história que estamos ficando parecidos por dentro e por fora”.

Camila tinha 5 anos quando casei com a mãe dela. Virei padrasto, ela enteada, descasei, casei de novo com outra mãe, descasei de novo – e ela continua filha. A mãe dela, passado.

Há duas semanas, em nova rodada de pastel na feira, o reencontro: Camila, os sobrinhos dela e meus netos, Alice e Joaquim, filhos dos irmãos de Camila e meus filhos, Manoela e Camil, o Valdir e eu. Quando viu a Camila, ele renovou a frase: “Continua a cara do pai”.

Foi amor à primeira vista. Quando fui morar com a mãe da Camila e também do Thiago, na época com 7 anos, os dois adoravam o pai, que por falta de tempo e outras circunstâncias não era muito presente.

O Thiago, em princípio, me rejeitou por completo. Afinal, era uma figura masculina ameaçando seu reino macho. Chegou a passar cola no meu pincel de barba de estimação. Foi uma relação complicada durante o casamento todo. Ao contrário da Camila. Nós nos grudamos como cola, ficamos como as cerdas do pincel de barba.

Caçula dos quatro “irmãos”, Camila virou minha companheira de compras e de tudo. Até de futebol. Ela, o pai dela, o Camil e eu torcíamos pelo mesmo time em Curitiba – o Paraná Clube. E lá íamos nós – menos o pai – para a Vila Capanema assistir os jogos mais absurdos do mundo do futebol. Paraná x Jandaia, na chuva – e  a gente gritando, xingando, comemorando, rindo –, vivendo uma bela história sem fim.

Sim, sem fim. Nestes 25 anos, Camila tomou a vida de assalto: batalhou como poucos fazem, venceu como raros conseguem, encantou como só os iluminados são capazes. Advogada com OAB, casada com um atleta, ri à toa. E mais: faz rir à toa.

E olha que foram 25 anos difíceis. Primeiro, o pai foi embora de repente. Depois, o avô – guru, ídolo e provedor da família – também embarcou para o outro mundo. Perdas que ela sente até hoje. Da mesma forma como nossa relação é a mesma até hoje. Aliás, relação tão forte que, diante de uma dívida da família que eu arcava sozinho e com muita dificuldade, ela ajudou a pagar alguns meses – sem nenhuma obrigação, mas por solidariedade, critérios de justiça e amor, muito amor.

Ela me emocionou milhares de vezes, mas as cenas mais fortes aconteceram nas datas festivas. Dia dos Pais era de chorar lençóis: bilhetinhos cheios de corações e cores que exalavam sentimento. Natal, Páscoa, sempre teve um beijo ou um telefonema – ao menos.

Até que chegou o dia de apresentar o namorado. No mesmo dia, apresentou para a mãe e para mim. Tempos depois, era o dia do casamento. Pai e filha entramos no templo onde foi realizada a cerimônia: o Terreiro de Umbanda Pai Maneco. Não tenho ilusão: tenho certeza de que, se o pai biológico estivesse vivo, seria ele; se o avô estivesse entre nós, seria ele. Nunca tentei substituir ninguém nem tive ciúmes, sequer olhei com o canto do olho. Sempre foi por amor e pela felicidade dela.

A cerimônia de casamento teve um significado especial. Mais ou menos assim: como um casal que vive junto há tempo e um dia resolve formalizar a união e casa. Nossa entrada na igreja formalizou nossa relação. Que vai durar – como a de todos os outros filhos – até que a morte nos separe. Coisa que o casamento não tem, coisa que só existe entre pais e filhos.

PS: nesse casamento, que foi o meu quarto, a mãe entrou com dois filhos – Thiago e Camila – e eu entrei com dois Manoela e Camil. E veio o terceiro filho de cada um – o quinto nosso. Ou melhor, a quinta: Olívia, hoje com 22 anos. O Thiago não cola mais meu pincel de barba, hoje somos colegas de profissão e amigos – bem amigos. Aparece de vez em quando para filar uma boia e jogar conversa fora – como todos os outros, que não deixam o pai sozinho minuto algum. A bênção, meus filhos.

Kico Gemael, 57 anos, jornalista, 5 casamentos, 4 filhos, 2 netos; curitibano de nascimento, paulistano de coração.

 

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Leitores contam o que aprenderam com a separação http://casardescasarrecasar.blogfolha.uol.com.br/2015/02/03/leitores-contam-o-que-aprenderam-com-a-separacao/ http://casardescasarrecasar.blogfolha.uol.com.br/2015/02/03/leitores-contam-o-que-aprenderam-com-a-separacao/#respond Tue, 03 Feb 2015 19:52:37 +0000 http://f.i.uol.com.br/folha/colunas/images/15005285.jpeg http://casardescasarrecasar.blogfolha.uol.com.br/?p=751 Resposta_cor_8

Para consolar o filho que se encontrava em um estado lamentável de tristeza causado por um tremendo pé na bunda levado da mulher, o pai soltou a clássica “O tempo é o melhor remédio, meu filho”. “Se fosse, vendiam na farmácia, pai”, retrucou o bem-humorado filho. Pois tempo também é preciso para se perceber que, além de sofrimento e/ou alívio, uma desilusão pode gerar conhecimento. E o melhor: sobre si mesmo.

Por isso, “Casar, descasar recasar” lançou no Facebook da Folha a pergunta “O que você aprendeu com a separação?” junto com o texto em que listo um pouco do que eu aprendi com o fim do meu casamento. Recebemos 289 comentários. Segue aqui uma boa amostrinha.

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Leitora conta como a crise dos pais marcou a sua vida para sempre http://casardescasarrecasar.blogfolha.uol.com.br/2015/01/27/leitora-conta-como-a-crise-dos-pais-marcou-a-sua-vida-para-sempre/ http://casardescasarrecasar.blogfolha.uol.com.br/2015/01/27/leitora-conta-como-a-crise-dos-pais-marcou-a-sua-vida-para-sempre/#respond Tue, 27 Jan 2015 22:42:56 +0000 http://f.i.uol.com.br/folha/colunas/images/15005285.jpeg http://casardescasarrecasar.blogfolha.uol.com.br/?p=569 Médica, casada, mãe de dois gêmeos de 8 anos, a mineira Maria Fernanda * procurou o “Casar, descasar, recasar” para contar a história de separação dos seus pais, que tanto a impactou na infância e que ainda hoje tem profunda influência na sua vida.

Num almoço em um shopping em São Paulo, a bela jovem mãe, de 42 anos, me deu o depoimento que segue abaixo. Por que esse empenho todo em expor sua história? Para evitar que ela se repita em outras casas, diz Maria Fernanda, que provoca aqui uma reflexão sobre como romper um casamento por causa de um grande amor, investir nessa nova relação e, ao mesmo tempo, preservar a saúde mental dos filhos.

(Ilustração: Malika Favre)
Leitora descobriu caso extraconjugal da mãe e conta como a crise dos pais impactou a sua vida (Ilustração: Malika Favre)

“Na entrada da adolescência, quando eu estava com uns 12 anos, que não é uma fase muito fácil, descobri que minha mãe tinha arrumado um namorado, um amante – a palavra é pesada e parece antiga, mas para os filhos e o ex-marido é isso que é.

Descobri por causa de telefonemas estranhos e pelo diário que ficava no quarto da minha mãe e um dia ela deixou aberto na cozinha. Comecei a ler e vi que escrevia sobre um outro homem, um namorado. Aí, veio a dúvida horrível: será que meu pai sabia? E meus irmãos? Foi supercomplicado, porque fiquei com aquele segredo. Não tinha coragem de comentar o caso nem com a minha melhor amiga. Sentia que ia expor minha mãe, meu pai, minha família toda. Não falei nada para ela, porque nunca foi meu estilo confrontar e também sabia que tinha feito uma coisa errada, invadindo a privacidade dela.

Era algo que eu ficava remoendo. Lembro que quando voltei de um acampamento de férias, minha mãe foi me buscar e disse ‘olha, fulano deu uns móveis aí para nós, mas não comenta nada com seu pai’. Ela pedia segredo, não sabendo que eu já sabia. Aquilo machucava muito.

Acabei contando para um dos meus irmãos, e para ele foi pior ainda. Até hoje é o mais complicado deles.

No fim, o casamento acabou. Meu pai saiu de casa. Para completar, após a dolorosa separação (para meu pai, eu e meus irmãos, mas não aparentemente para minha mãe, que estava apaixonada), ela se viu no direito de levar o então “namorado” para dentro de casa, como se nossa casa fosse um motel.

Ela não disse algo como ‘olha, agora eu me separei do seu pai, esse é meu namorado e vamos conviver…’. O cara aparentemente não tinha intenção de ter um relacionamento mais sério com ela nem de ser padrasto de ninguém. Ao mesmo tempo, ele estava dentro da minha casa. Vinha e dormia uma ou duas vezes por semana.

Minha mãe achava que estava no seu direito. Cheguei a ouvir que a casa era dela, que fazia o que queria e não é porque teve filhos que não poderia mais ser feliz.

Realmente, ela bancava tudo e era pesado para ela, porque meu pai se desestruturou completamente, não pagava pensão, mas ela não teve a preocupação de nos preservar.

Nunca conversamos sobre o assunto. Nossa relação é muito difícil até hoje, permeada de muita agressividade. Às vezes, ela até tenta, enfim, ajudar, proteger, até financeiramente quando eu preciso, mas não é uma pessoa muito disponível emocionalmente. Nunca foi.

Resolvi contar tudo isso aqui pensando nos pais. Tudo bem você se apaixonar, viver uma história muito intensa com uma pessoa, mas seu amor pelos filhos tem que estar preservado. Diga: ‘Eu gosto dessa pessoa desse jeito e realmente gosto muito e vou querer ficar com ela, vou investir nessa relação, mas vocês continuam importantes para mim e isso não vai mudar’. O filho tem que ter sempre certeza de que é amado, que, por mais caótica que seja a vida dos pais, ele é prioritário.

E se vai esconder, esconda, mesmo! O problema é você deixar uma porta aberta. Se vai ter um diário, deixe em um lugar trancado. Preserve a sua vida de adulto.

Quer encontrar com o namorado, transar com seu namorado (ou sua namorada)? Vá ao motel. Seja com o cônjuge, se a pessoa é casada, ou a (o) namorada (namorado), filho não tem que participar da vida sexual dos pais.

Isso me marcou para o resto da vida. Já fiz analise várias vezes, e esse sempre é um tema importante. Mas também serviu para mim como mãe. Tenho jornadas muito extensas de trabalho, só vejo meus filhos à noite. Mas procuro sempre mostrar que eu estou atenta, que me importo com o que eles sentem, com que pensam. Quero que sintam sempre que estou lá, à disposição.”

Essa mãe agiu com total descaso em relação aos seus filhos, foi vítima de muita ignorância ou padeceu de uma imensa dificuldade em fazer diferente? Não dá para julgar.

Agradeço a colaboração dessa leitora porque histórias da vida real provam que, definitivamente, não tem jeito: os pais têm que segurar a onda da crise no casamento e, ao mesmo tempo, proteger  os filhos.

* Nome fictício, a pedido da leitora.

 

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